e repente, Wílson Mano chutou e marcou 1 a 0 sobre o São Paulo em 13 de dezembro de 1990. Não era só um gol. Era a abertura para o primeiro título do Campeonato Brasileiro da história do Corinthians. Aquela também era a noite da formatura de Débora Portela na 8ª série e ela abriu mão da festa por não ter um walkman para ouvir a partida, naqueles tempos em que a internet não reinava absoluta nas telas dos celulares. Ela ficou em casa, ouvidos grudados no rádio e na voz do narrador José Silvério, no quarto, e o pai, responsável pela “corintianice” toda, no outro cômodo, como mandava a tradição familiar.
Quando o gol aconteceu, tão grande quanto a festa no estádio, Débora foi para a cozinha da casa. Pai e filha se encontraram, se abraçaram, e voltaram aos seus postos para torcer contra o rival. Um riso frouxo e fácil tomou conta dela. No bairro Rio Bonito, zona sul da capital paulista, toda a desistência fez sentido. O Corinthians virou bússola para o caminho da vida da adolescente, elo inseparável que a unia a seu pai. Era ela, a mais velha das 3 filhas, que o acompanhava aos estádios, que escutava as transmissões dos jogos do Timão.
Foi para trabalhar no Corinthians que ela ousou sonhar ser a primeira pessoa da família a ter um diploma universitário. “Queria uma profissão que me deixasse perto do Corinthians. Pensei primeiro em fazer direito, para ser advogada do time. Depois, psicologia, para ser psicóloga do Corinthians. O trabalho era uma forma de eu ficar perto do clube”, conta. Mas foi o gosto pelas notícias (também sobre o Corinthians) que chegavam pelo rádio a guiou ao jornalismo.
A partir daí, era como se a sorte andasse com ela, de mãos dadas. Ela quis estagiar na Rádio Jovem Pan. Conseguiu. Quis conhecer os jogadores, trabalhar com noticiário esportivo. Conseguiu. Depois, contratada como editora de esportes da TV Bandeirantes, acompanhava o dia a dia do timão, parceira de trabalho de um dos grandes ídolos, o atacante Neto.
Débora foi além, em pouco tempo, marcando um gol atrás do outro. Indicada para uma vaga na TV Cultura, teve a possibilidade de mergulhar na história do time, tendo nas mãos os arquivos do programa Grandes Momentos do Esporte. O jornalismo esportivo deu a ela a chance de morar sozinha, de ajudar os pais, irmãs e sobrinhas, de fazer do sonho realidade. “A sorte sempre me estapeou. As portas se abriam para mim. Fiz amigos, construí laços. Eu fui muito, muito feliz fazendo o Grandes Momentos do Esporte. Fazia todo sentido para mim”, reflete. Entre uma entrevista e outra conheceu Vladimir, Rivelino, Marcelinho Carioca. O pai se orgulhava da filha que estava lado a lado com os maiores jogadores da história do Timão.
“A sorte sempre me estapeou. As portas se abriam para mim. Fiz amigos, construí laços. Eu fui muito, muito feliz fazendo o Grandes Momentos do Esporte. Fazia todo sentido para mim”
Débora Portela
Em 2009, Débora embarcou de mala e cuia para a China. Assumiu vaga no departamento de português da Rádio Internacional da China, uma espécie de BBC da Ásia, transmitindo em 60 idiomas. O salário era bom, as descobertas se descortinavam a cada esquina, a oportunidade de desbravar os mistérios do Oriente se fez real. E em meio a tantas alegrias ela percebeu que o jornalismo não a seduzia mais. O Corinthians a levou às notícias. O fato sem o time não tinha mais porquê.
Ao voltar ao Brasil em 2012, Débora estava casada, havia viajado muito e visto que o mundo era bem maior do que as quatro linhas do gramado no Parque São Jorge.
Cavando brechas no mercado de trabalho nacional, Débora até procurou outros empregos, mas as redações de televisão se mostravam um ambiente de estresse e angústia para ela. Sofreu, se questionou, colocou a vida na balança, fez terapia, recalculou os gastos. Refletiu e desistiu. Desistiu da carreira que construiu durante 16 anos. Deixou para trás, abandonou.