Uma aula real de como fazer um bom festival foi dada em Brasília. Longe do eixo sudestino e trazendo a favela para o Eixo Monumental, o Favela Sounds fez mais uma vez história. Carregando o tema “As muitas formas de narrar”, a sétima edição do maior festival de cultura periférica do Brasil veio mais uma vez com tudo e levou 30 mil pessoas para Esplanada dos Ministérios.
O line-up focado na cultura de favela não tinha as figuras que ocupam basicamente todos os palcos pelo país. O foco ali era trazer o que a periferia ouve e gostaria de ver em cena. Não à toa, o funk dominou a programação.
No primeiro dia, a drag queen Lia Clark fechou a programação com seu set “sem frescurinha”, botando um balé nervoso pra jogo e entoando músicas próprias e feats de sucesso. Não faltou “Sereia”, parceria com Pabllo Vittar e que abre os trabalhos do novo álbum de Lia, “CLARK (pt. 2)”.
“Eu estou muito feliz porque quando eu comecei minha carreira musical, um dos meus maiores sonhos era ocupar grandes palcos, grandes festivais. Agora tô aqui como headliner do Favela Sounds, que é um festival que traz culturalmente a galera da periferia, da quebrada, com seu estilo, seja o rap, seja o funk para ocupar que o centro de Brasília”, conta Lia.
A artista encerrou o primeiro dia de programação que teve ainda a dupla Margaridas (DF), TRP.P (Canadá), MC Luanna e Tasha & Tracie (SP), além dos DJs caju (DF), Barbie Plus Size (PA/PR), Eva do Santo Amaro (RJ) e Anderson do Paraíso (MG). “É algo muito icônico porque é a nossa capital, e eu tô muito feliz porque, como drag queen funkeira, a gente se vê muito ilimitada de chegar em vários lugares. Assim, acabamos mostrando que é possível”, desabafa.
O funk veio com força também no segundo dia de evento, que teve na programação Deize Tigrona, uma das primeiras mulheres a botar a cara no gênero musical e falar sobre o prazer a partir de uma perspectiva feminina. “Agora eu sou uma artista independente, tô tomando as rédeas da minha arte e, conforme eu entreguei lá (na turnê na Europa), pretendo entregar aqui no Brasil, até porque é onde queremos fixar o funk. Queremos que o funk realmente seja expandido, abraçado e aceito, que seja referência para outras pessoas para dar essa continuidade. O tempo tá passando, a gente tá perdendo bastante amigos por aí. Fiquei bem abalada com isso, então é importante dar essa continuidade”, diz Deize.
“É um caos estar vivendo uma parada maneira que é conseguir essa tour pela Europa de novo, mas quando vemos que o funk ainda sofre esse preconceito no Brasil e perde essas referências que são o Marcinho e a Kátia, dá realmente essa estourada na bolha”, conta. “Vejo essa minha criação de diversidade muito importante para poder me manter. Eu tô conseguindo me reinventar em meio ao caos, então tem bastante novidade vindo”, conclui. “Há fôlego!”.
E há mesmo! As provas vieram logo na sequência de Deize, com os shows de Slipmami e do maravilhoso DJ Mu540 (leia-se Muzão). A programação teve ainda Clara Lima, Hate RCT, o afrobeat nos sets de V4ne MRQS (leia-se Vane Marques), UMiranda e Ketlen. O samba traz um de seus grandes representantes, Toninho Geraes, para participação em show da banda Filhos de Dona Maria, em uma homenagem à tradição do estilo no Distrito Federal.