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O brega contra o preconceito

Para fechar o projeto Night Embassy, da Jägermeister, a produtora artística Ane Oliveira lotou a programação com influências do brega e da cultura paraense

por Jägermeister + Elástica Atualizado em 25 out 2022, 16h45 - Publicado em 24 out 2022 17h24
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(Jaegermeister/Reprodução)

Toda festa uma hora acaba, deixando saudade e aquele gosto de quero mais. No último final de semana, foi a vez do projeto Night Embassy, da marca de licor alemão Jägermeister, encerrar sua programação após três intensas semanas de ocupação artística, agito e intercâmbio de saberes, no Palacete da Sé, no centro de São Paulo.

No último fim de semana, a embaixadora da noite foi a produtora artística e educadora Ane Oliveira, natural de Belém do Pará, acompanhada do cantor e cineasta paulistano Novíssimo Edgar, que esteve presente como mentor na concepção do evento. Para fechar com chave de ouro, Ane fez do brega o grande emblema da programação, das oficinas às festas. 

Novíssimo Edgar e Ane Oliveira – embaixadores do último final de semana de Jagermeister Night embassy

Para mostrar a influência desse gênero em novos estilos musicais, Ane convidou o produtor cultural Zek Picoteiro para uma aula pouco convencional: discotecar e, ao mesmo tempo, contar sobre a história e evolução do brega dos anos 1980 até 2000. Embora existam muitos subgêneros, como o melody (brega pop) e o brega funk, todos eles mantêm a fusão de um estilo excessivamente romântico, com um humor que faz qualquer um em volta querer dançar – dançar colado, obviamente.

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(Breno da Matta/Fotografia)

Na festa da última sexta-feira, 21, Ane escolheu pesar no tecnobrega e, para isso convidou Luísa Nascim, DJ Carol Tucuju, DJ Sumano, Keila (com participação de Novíssimo Edgar) e DJ Miss Tacacá. Já no sábado, 22, preferiu um estilo um pouco mais híbrido, com shows da cantora mexicana Pahua, da peruana Shushupe e da banda de Saulo Duarte, que alegrou a noite com muito carimbó e guitarrada (uma mistura de choro e carimbó). Nas pick-ups, a discotecagem ficou por conta da Festa AMEM e da dupla Aisha e Yaminah. Para coroar a noite final do Night Embassy, todos os embaixadores e mentores dessa primeira edição estiveram presentes.

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(Breno da Matta/Fotografia)

Infiltrações do Norte

No Pará, o ritmo brega já foi declarado Patrimônio Cultural e Imaterial em 2021. E, apesar de ser tocado por todos os cantos do país, Ane enxerga ainda muito preconceito em torno do gênero. Há, para ela, uma invisibilização da cultura paraense, que seria constantemente relegada a uma posição inferior em relação a produções de outros estados, principalmente do sudeste. Por esse motivo, escolheu o nome Infiltrações do Norte, no sentido de expressar algo que está presente há muito tempo, mas que demora a ser percebido. Ou nesse caso, reconhecido. “É a provocação de um lugar de invisibilidade. Eu questiono como não temos grandes nomes do Pará, do Norte, nos grandes festivais.”

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(Breno da Matta/Fotografia)

Para ela, há um exemplo concreto de como a discriminação ocorre atualmente. “Neste ano, o brega funk foi uma vertente que nasceu do brega e que se difundiu muito em São Paulo, mas isso se dá pela influência do funk, que vem do Rio de Janeiro. O brega funk conseguiu acessar espaços, como grandes festas e festivais, muito mais do que o tecnobrega ou o melody, típicos do Belém.”

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(Breno da Matta/Fotografia)
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Novíssimo Edgar tem a mesma opinião. Ele conta que sua participação na residência de Ane se deu principalmente a partir de conversas e provocações. “A pergunta que tivemos que responder em nossa curadoria era ‘qual é o futuro da música brasileira?’ E o futuro da música brasileira está acontecendo lá, no Pará”, ele conta. “Nossa intenção era tirar a venda dos olhos do público para enxergarem essa riqueza cultural do Pará.”

“É a provocação de um lugar de invisibilidade. Eu questiono como não temos grandes nomes do Pará, do Norte, nos grandes festivais. Como podemos contribuir para olharem nossas produções de forma menos folclórica e estereotipada?”

Ane Oliveira
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(Breno da Matta/Fotografia)

Um dos objetivos de Ane e Edgar era trazer nomes de peso, mas ainda pouco conhecidos em São Paulo. Uma dessas artistas é Treme Keila, que se apresentou e discotecou na festa Embalos da Pororoca, na sexta. Mas os convites não se limitaram a profissionais da música nacional. Uma das atrações mais celebradas da noite foi a participação da peruana DJ Shushupe (nome artístico de Úrsula Talavera), que funde sons tradicionais do Peru com música eletrônica. O resultado é um ritmo dançante que conversa muito bem com o brega. 

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(Breno da Matta/Fotografia)

Sons do dia a dia

Ane conta que a sua relação com a música vem de berço. Em seu bairro, o brega fazia parte do seu dia a dia quase como uma trilha sonora. “Cresci em uma vila, entre os bairros Canudos e Marco, no Belém, e um de nossos vizinhos tinha um sistema de aparelhagem, que ele chamava de Roberto Sound, e sempre botava esse som virado para rua. Aquilo não incomodava a vizinhança, pois já fazia parte da vivência da comunidade. Aquilo indiretamente me influenciou muito no percurso que segui.”

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“A pergunta que tivemos que responder em nossa curadoria era ‘qual é o futuro da música brasileira?’ E o futuro da música brasileira está acontecendo lá, no Pará. Nossa intenção era tirar a venda dos olhos do público para enxergarem essa riqueza cultural”

Novíssimo Edgar
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(Breno da Matta/Fotografia)

Durante a ocupação, a influência do brega e a forte presença da musicalidade e das festas de aparelhagem na cultura paraense estiveram presentes em toda a concepção expográfica da ocupação. Assim como os outros embaixadores, Ane ocupou um dos andares com uma instalação artística, exibindo vídeos em grandes tecidos. As imagens são da documentarista Nay Jinknss, que percorreu a Feira do Açaí, no Mercado-Ver-o-Peso, uma das feiras livres mais antigas do país, localizada nas margens da baía do Guajará. Além da dinâmica alegre de seu povo, e, ao mesmo tempo, triste, diante da miséria, Ane e Nay reforçam a importância da música na memória e identidade paraense. Ali, há o mar, a busca pelo sustento através do comércio, os olhares tristes e desesperançosos, mas também uma energia alegre que sempre se expressa pela dança – e claro, o brega, que une a todos. Nessa festa, Ane fez todos quererem ir embora para o Pará.

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(Breno da Matta/Fotografia)

Jägermeister Night Embassy

Em 2022, o projeto pisou pela primeira vez na América Latina, após ter passado por Berlim, Moscou e Joanesburgo. Seu propósito é extrapolar o sentido de festa como escapismo da rotina e também ser um espaço de novas conexões, de liberdade e criação. Seus protagonistas são artistas e profissionais multidisciplinares e periféricos – quase todos possuem uma forte conexão com a cena LGBTQIAP+, frequentemente escanteada em grandes eventos culturais, e que dessa vez teve protagonismo. Nas primeiras semanas, o estilista Diego Gama e o Coletivo AMEM foram responsáveis pela curadoria artística e pela agenda de atividades.

Veja aqui como foram os primeiros finais de semana!

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